Cidades inteligentes como um meio para a paz urbana
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A versão 2018 do relatório “World Urbanization Prospect”, da Divisão de População da ONU, indica que 55% da população mundial vive em cidades e que esse percentual deve chegar a 68% em 2050. Na América Latina, o percentual de habitantes em áreas urbanas que hoje é de 81%, deve crescer ainda mais nos próximos 30 anos. Em uma interpretação inicial, estes números indicam que a população deve experimentar uma onda de facilidades que, normalmente, vem atrelados a viver em cidades quando comparados as possibilidades oferecidas fora do contexto urbano. No entanto, essa interpretação é míope dado que, acompanhando a alta dos índices de urbanização na América Latina, existe uma alta de indicadores que denotam a piora na qualidade de vida dos cidadãos, tais como o aumento do número absoluto de crimes, aumento da quantidade de horas gastas no trajeto casa-trabalho e, consequentemente, o aumento do custo de vida nas cidades. A origem dos fatores que culminam com a piora na percepção da qualidade de vida é variada: englobam aspectos econômicos, incluem a falta de planejamento urbano e de governança urbana, justificada, incorretamente, pela diferença no viés político dominante, em uma combinação que aumenta cada vez mais a distância entre expectativa e realidade dos cidadãos em relação à cidade.
No entanto, algumas cidades, tem tomado, desde a década de 80, iniciativas para que a migração às cidades e o aumento da população urbana seja acompanhada de um aumento na qualidade de vida dos cidadãos, visitantes – incluindo aqueles temporais (turistas ou visitantes laborais) – e aqueles que têm relação indireta, seja por conta dos movimentos pendulares de comutação diária, seja por conta da existência de uma estrutura de forte impacto social, como a existência de um aeroporto, um estádio ou um pólo fabril. Um exemplo positivo de como tratar essa questão vem da Espanha, mais especificamente, da cidade de Barcelona, que considera em suas ações urbanas os impactos advindos das cidades que compõem a Area Metropolitana de Barcelona, onde se encontra, por exemplo, o principal aeroporto da região, o aeroporto de El Prat, na vizinha El Prat de Llobregat.
A cidade de Barcelona, desde 1987, (portanto, antes da realização dos jogos olímpicos de 1992), estabeleceu um plano de longo prazo para sua área metropolitana, englobando ações nas áreas de mobilidade, educação, saúde, telecomunicações, administração pública, atendimento ao cidadão e governança, com metas bem definidas, para serem cumpridas em prol da cidade, independentemente do viés político vigente no executivo. A meta parece ter sido cumprida e se reflete, em algumas ações tomadas depois das olímpiadas, por exemplo, a construção de aproximadamente 75km de metrô (chegando a um total de 119km, superior as cidades de São Paulo, com 91km ou Rio de Janeiro, com 58km), a integração completa intermodal através de bilhete único, uma extensa rede de wi-fi gratuito na cidade, cursos gratuitos para capacitação profissional e um intenso ambiente empresarial.
Esta realidade reflete a visão atual da cidade, centrada no ser humano, que respeita e valoriza a identidade de cada bairro e usa a tecnologia como meio para transformar positivamente o dia a dia. Barcelona, considerada como um exemplo de cidade inteligente moderna, deseja ser uma cidade autossuficiente de bairros produtivos a velocidade humana, dentro de uma área metropolitana hiperconectada e com emissão zero. Ser uma cidade inteligente moderna não significa que não o fosse antes: apenas foi adicionado, mais recentemente, o fator “tecnologia” à esta já exitosa receita, permitindo que muitas das soluções implementadas atualmente sejam o resultado de um mix de tecnologia, planejamento urbano e esforço político, tendo como objetivo maior trazer paz para os cidadãos.